HOMENS QUE ABORTAM


Elias Inácio de Moraes

Quando se fala em aborto e em formas de se defender a vida do espírito que deseja renascer no mundo, todos se voltam para a mulher que aborta; raros pensam no papel do homem nessa questão. Esquecem-se de que mulheres não engravidam sozinhas e que não abortam por prazer. Se o fazem é porque estão sofrendo, e esse sofrimento, na maioria das vezes é provocado pelas atitudes de homens que estão à sua volta.

Em uma pesquisa em nível de Mestrado realizada em Salvador/BA, constatou-se que de cada três mulheres que abortam duas vivem algum tipo de pressão psicológica, emocional ou física, provocada por um homem, que pode ser seu pai, namorado, companheiro ou marido. A maioria delas são jovens, negras, com baixa escolaridade, dependem economicamente de um homem e apresentam graves problemas de auto-estima.[1]

Há tempos que as pesquisas vêm alertando para a relação entre aborto e violência doméstica. Não há como reduzir a incidência de abortos sem reduzir antes os fatores sociais que promovem a sua incidência, sendo que o principal deles, segundo as pesquisas, são as variadas formas de violência contra a mulher.

Ainda em 1997 a Heartbeat divulgou um estudo desenvolvido no Canadá no qual os autores constatam que muitas vezes a própria decisão de abortar é resultante de uma situação de abuso recorrente a que a mulher já se achava submetida antes mesmo de engravidar, e que se mantinha durante a gravidez.

Muitas mulheres são forçadas a um aborto indesejado pelos seus maridos, namorados, pais ou outras pessoas do seu convívio. Se essa mulher estiver sendo repetidamente vítima de algum tipo de abuso, o aborto indesejado pode ser compreendido como mais um ato de violação em uma vida que já é caracterizada por diversos tipos de abuso. [2]

Uma análise combinada de várias questões de O Livro dos Espíritos sugere que a responsabilidade por um determinado ato, quando ocasionado por terceiros, “recairá sobre aquele que lhe houver dado causa”. Muitas vezes as faltas cometidas por uma pessoa são resultado do meio onde ela se acha colocada. “Quando (a sociedade) praticar a lei de Deus, terá uma ordem social fundada na justiça e na solidariedade e ele próprio (o ser humano) também será melhor”.[3]

Portanto, para reduzir a incidência de abortos não basta criminalizar o aborto, ameaçar com detenção ou mesmo “educar e esclarecer” as mulheres; é preciso, sobretudo, educar os homens, eliminar da sociedade as variadas formas de dominação e de abuso, e resgatar, desse modo, a dignidade e a auto estima da mulher. Aí, sim, as taxas de aborto poderão ser reduzidas gradativamente, porque mudanças tão profundas não acontecerão da noite para o dia mediante um simples decreto.


[1] Diniz, Normélia M. F. e outras. Aborto Provocado e Violência Doméstica entre mulheres atendidas em uma maternidade pública em Salvador/BA. Rev. Bras. Enfermagem n.64 pag. 1010, nov-dez 2011.
[2] A Heartbeat International, é uma ONG cuja missão é evitar o aborto mediante assistência às mulheres grávidas. Foi criada nos EUA logo após a legalização do aborto e hoje já está presente em vários países.
[3] Kardec, Allan. O Livro dos Espíritos, questões 717, 927, 930, 940 e 946-a. Ed. Feb, Rio de Janeiro/RJ.

Comentários

  1. Muito bom! Alerta para o lado da mulher que, mesmo sendo vítima desta violência, se torna algoz no caso em que não aguenta mais e provoca o aborto. Ficou muito esclarecedor!

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  2. É fundamental tirar o foco da mulher nessa questão e se analisar o contexto que a conduz à prática do aborto.

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