FAMÍLIA E GÊNERO NA EDUCAÇÃO INFANTIL



Elias Inácio de Moraes

Com o objetivo de reverter o triste título de campeão mundial em assassinatos de gays, travestis e outras pessoas transgênero, o que, aliás, tem dificultado ao Brasil se constituir em “coração do mundo e pátria do Evangelho”, um grupo de Psicólogos, Pedagogos e Cientistas Sociais coordenados pelo MEC elaborou uma proposta de abordagem das questões relativas à diversidade de gênero que teria como foco a Escola. Levou-se em conta o potencial de transformação social que a Escola representa na sociedade moderna enquanto espaço de construção de uma nova mentalidade, desprovida dos arraigados preconceitos que têm levado famílias e sociedade a esse lastimável quadro de conflitos devido à não aceitação da condição homoafetiva de seus filhos e jovens.

Através do sistema educacional se estabeleceu um projeto de esclarecimento de longo prazo para cuja implementação foi elaborado o caderno Escola sem Homofobia que, juntamente com outros recursos pedagógicos em formato de vídeo, tinham como foco a preparação dos professores para a “identificação de sinais de abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes” e para a “proteção à infância e à adolescência para o enfrentamento da violência sexual”. Esse guia, tal como propõem diversos estudiosos do Espiritismo com base nos textos de espíritos ilustres como Emmanuel e do próprio Kardec, ratificadas por palestrantes também de renome nacional e Internacional como Rossandro Klingey e Simão Pedro, procura naturalizar a abordagem em torno das questões relativas à homoafetividade, de modo a reduzir o preconceito e a ocorrência de bulling nas escolas, primeira manifestação de violência de gênero e principal causa de desistência escolar por parte das crianças e jovens que são desde cedo identificados como “diferentes” por apresentarem evidências de sua condição transexual.

No Congresso Nacional os deputados das bancadas da Bíblia (evangélicos conservadores), do Boi (agropecuaristas) e da Bala (Delegados de Polícia), incomodados com o avanço das pautas LGBTT que culminaram na aprovação pelo STF das uniões homoafetivas e da adoção de crianças por esses casais, entenderam que isso se constituía em uma agressão aos “valores da família tradicional”. Estabeleceram então um movimento de reação a essas conquistas, buscando, através de ações de marketing social, obter o apoio da população para uma revisão dessas decisões dentro do poder legislativo, representado hoje por deputados e senadores envolvidos nos mais obscuros escândalos de ética e de descompromisso com as questões de interesse da sociedade.

Mediante uso distorcido de alguns recortes de vídeos e de materiais impressos que seriam distribuídos aos professores, esses deputados passaram a referir-se ao caderno Escola sem Homofobia pela expressão pejorativa “Kit Gay” e, para referirem-se às questões relativas à “Diversidade de Gênero” de maneira a causar impacto nas mentes populares, adotaram a expressão “Ideologia de Gênero”, provocando uma associação direta com os conflitos político-ideológicos do momento e associando essas discussões ao partido político cujo governo possibilitou que essa pauta tivesse seguimento ao longo dos últimos dez anos. Desse modo, associaram indevidamente essas conquistas a um ideário de pessoas “comunistas”, ao “legado marxista”, e a outras expressões que, em virtude do momento de forte confronto político-ideológico pelo qual atravessa nosso país, encontraram fácil aceitação nas mentes populares e intensa repercussão nas redes sociais.

O que se pretende com essas medidas, mais do que impedir que as crianças sejam desde cedo esclarecidas quanto à diversidade de gênero, é reverter as conquistas da comunidade LGBTT através de novos dispositivos legais, anulando as decisões do Supremo Tribunal Federal que permitiram as uniões civis e a adoção de filhos por parte de casais homoafetivos.

Faz-se vista grossa ao suicídio de adolescentes em decorrência da não aceitação de sua condição homoafetiva por parte de seus pais, que é hoje a principal causa de suicídios nessa faixa etária, e se insiste na imposição de um conjunto de comportamentos heteronormativos à minoria homossexual, mediante processos de violência psicológica travestidos de “métodos terapêuticos”, condenados pela Organização Mundial de Saúde, pela Comissão de Direitos Humanos da ONU e pelo Conselho Federal de Psicologia em virtude da flagrante manifestação de desrespeito a uma condição que – o Espiritismo nos esclarece – está ligada às necessidades do espírito em seu processo de aprendizado e de crescimento.

Se desejamos contribuir para a solução dos graves problemas sociais envolvidos nessa temática, como também manter o Espiritismo em sintonia com a Filosofia e a Ciência do nosso tempo, é forçoso reconhecer que, desde a transição do milênio, já se vem consolidando na Psicologia, na Sociologia e na Antropologia uma compreensão de que a homoafetividade, tanto quanto a heteroafetividade, é uma condição natural do ser humano, razão pela qual essa nova visão, desprovida de preconceito, deve orientar as nossas ações enquanto sociedade que pretende construir o "mundo de regeneração", ou o "reino dos céus", onde não há espaço para violência de gênero, seja contra mulheres, seja contra homossexuais.

OBS: Conheça o caderno Escola sem Homofobia e todo o material produzido pelo MEC no link https://novaescola.org.br/conteudo/84/conheca-o-kit-gay-vetado-pelo-governo-federal-em-2011. Vale a pena ver, sobretudo, os comentários dos visitantes, que dão uma clara visão dos valores que movem essa discussão em meio à sociedade.

Conheça também o excelente artigo Família e Gênero na Educação Infantil, produzido pelas pedagogas Aline Cássia dos Santos e Roseline de Oliveira Lima, inserido como sendo o capítulo 6 do livro Além das Diferenças II, disponível gratuitamente em pdf no link: https://goo.gl/pHCFH4

Comentários

  1. Parabéns pela iniciativa de trazer uma discussão sensata e informada para o meio espírita.

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  2. Muito bom texto! Muito interessante a forma como você insere o espiritismo nas discussões atuais. Caminhamos rumo a evolução sempre, mesmo que haja quem lute contra. No fim, caso não prevaleça amor ao próximo, ao menos o respeito há de prevalecer.

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  3. Totalmente contra qualqier tipo de preconceito. Mas importante lembrar que estamos diante de uma eleição muito complexa e eh informação eh sempre muito bem vinda. Vejam este video do Divaldo.

    https://www.youtube.com/watch?v=XyT8VLMtRNE

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  4. Que bom que você foi fundo na leitura, Sérgio! Espero contribuir com seriedade nessas reflexões. Também este assunto tem gerado polêmica no meio espírita por falta de estudo mais aprofundado. Espero que possamos estabelecer um bom diálogo a respeito de todas essas temáticas que representam desafios ao nosso entendimento. Um abraço.

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